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Foto do escritorNicole Micaldi

Sapataria: Essa é uma banda de lésbicas!

Formada em 2016 na cidade de São Paulo, a banda Sapataria é composta por quatro lésbicas : Zu (Vocal), Marina (Guitarra), Dan (Baixo) e Isabelle (Bateria). Com influências da cena Riot Grrrl, Punk e Hardcore, a banda discorre sobre lesbiandade e feminismo, colocando nas músicas acontecimentos vividos pelas próprias integrantes.

“...é tudo extremamente pessoal, mas ao mesmo tempo reflete a realidade de outras lésbicas que enfrentam lesbofobia dentro de casa, não são reconhecidas pelas sogras, são expulsas do banheiro feminino, etc. Isso nunca foi uma regra da banda, mas simplesmente aconteceu, porque a maioria dos nossos sentimentos que precisam ser gritados estão ligados a nossa condição enquanto mulheres lésbicas."

Em Setembro de 2018, a banda lançou seu primeiro EP, com 6 músicas, auto intitulado "Sapataria".     A  primeira faixa do EP, Orgulho, foi pensada inicialmente para ser uma música- assim como as outras presentes no EP-, mas acabou se tornando a intro, de 58 segundos, que logo do inicio já nos passa a noção da força, resistência e empoderamento do primeiro EP da banda.

“...para que cada pessoa que começa a ouvir nosso EP ou assistir nosso show já saiba de cara o que esperar, e já tenha a noção de que sermos todas lésbicas não é uma coincidência, mas sim o fator principal que nos une e o motivo pelo qual a banda foi criada. 'Essa é uma banda de lésbicas' e nós temos muito orgulho disso!”

O EP pode ser encontrado através das plataformas YouTube, Spotify, Bandcamp, Deezer, Apple Music. Quer ouvir o EP na integra? Clique aqui. Mostra As GuriasComo e quando começou a banda?

Marina (Guitarra): No fim de 2016 eu e Dan começamos começamos a conversar bastante sobre formar uma banda. Assim que assisti o show da Charlotte Matou um Cara minha vontade de ter uma banda se multiplicou então levei a Dan para ver uma apresentação delas também e a convenci, com a ideia de ter uma banda só de lésbicas. Depois disso, em uma sinuca sapatão, Zu se candidatou para assumir o microfone, e Clara, a primeira baterista, ficou com as baquetas. Atualmente a baterista é a Isabelle, que entrou na banda em agosto desse ano.

MG: Quais são as referências da cena para a banda? Sapataria: Na cena brasileira, Charlotte Matou um Cara, Ratas Rabiosas, Bioma e Bertha Lutz são algumas das várias bandas de mulheres que nos influenciam e já tivemos o prazer de tocar junto.

MG: Quais são os próximos projetos agora que lançaram o primeiro EP? Sapataria:O próximo passo é compor mais alguns sons, juntar com as três músicas novas que já temos e fazer mais um EP ano que vem. Como planos mais imediatos, fazer o EP físico, camisetas com nossa nova identidade visual, videoclipe e tocar muito!

MG:Como vocês avaliam o cenário punk/hardcore atual?

Sapataria:Várias bandas compostas por mulheres estão surgindo, isso é muito positivo e trás muita renovação! O punk/hc precisa de novidade para se conectar com novas pessoas e acredito que aos poucos isso está acontecendo. Muitos eventos têm se preocupado mais com chamar bandas de mulheres para tocar.

Além disso é importante ressaltar movimentos como o "Hardcore contra o Fascismo" que trás a tona a mensagem base no punk/hc e faz com que as bandas repensem e fortaleçam seus discursos anti-LGBTfóbicos, anti-racismo, anti-machismos e se posicionem de maneira firme.

MG: Como vocês avaliam a participação de mulheres na cena, tanto como artistas como quanto público? Marina (Guitarra): Várias bandas novas de mulheres estão surgindo, isso me deixa muito feliz! Passei dos 14 aos 18 anos frequentando o Hangar 110 todos os finais de semana e consigo contar nos dedos de uma mão quantas mulheres vi no palco. É muito gratificante ver a banda Cosmogonia ocupando um espaço importante no Oxigênio Fest, eu demorei muito tempo para conhecer o riot grrrl e acredito que uma forma de apresentá-lo para outras mulheres seja justamente ocupando espaços em que elas já frequentam e que tocam majoritariamente bandas masculinas. Embora esse crescimento da cena riot e de novas bandas esteja acontecendo, ainda temos um longo caminho pela frente, porque a parcela que tem conseguido algum destaque ainda é muito pequena em comparação com a quantidade de homens; e em relação à representatividade o caminho é ainda mais longo, porque quando se fala em banda "de mina" ainda se pensa muito em uma mulher branca e classe média, é preciso pensar nesses espaços de uma forma mais plural e acolhedora, acredito que esse seja o maior desafio!

MG:Vocês já participaram de alguns eventos voltados para banda de minas. Na opinião de vocês, qual é a importância e a necessidade desses eventos para bandas de gurias que já estão na estrada e para que estão começando agora? Sapataria:Tocar em eventos feitos por e para minas é sempre muito acolhedor, é muito positivo como espaço de fortalecimento. Tanto a mulher que toca quanto a mulher que assiste encontra um local completamente diferente dos shows masculinos ou mistos - representatividade no palco, bate cabeça só de mulheres, etc. Na maioria das vezes homens são mais incentivados a tocar (principalmente quando se fala de hardcore) e ocupar espaços do que as mulheres, então esse tipo de evento também nos ajuda ajuda a entender que esse sim é nosso lugar, e quando não for, vai passar a ser. São normalmente nesses lugares em que surgem novas bandas, novos contatos e projetos, daí a importância de nos conectarmos.

MG:Sabemos que o machismo, homofobia e outras formas de discriminação estão muito presentes na cena. Vocês já foram vítimas de alguma dessas questões?

Sapataria:Tocamos esse ano em um espaço onde a banda anterior a nossa começou a usar a palavra "viadinho" como deboche entre eles. Tentamos dialogar e explicar que aquilo era ofensivo e que por mais que não fosse direcionado a nós o comentário, nos ofendia do mesmo modo - além disso, a atitude era recorrente, já tínhamos tocado com eles antes e o mesmo aconteceu.  A banda ignorou e quando iniciamos o show tanto a banda como seu público prosseguiu com os gritos, com objetivo de nos provocar. Já ouvimos comentários também sobre nos compararem com garotos adolescentes, por exemplo. Mas no geral acabamos tocando mais em eventos em que o público está minimamente preparado pra nos receber bem, já conhecendo a proposta da banda.

MG: Como foi o processo de gravação do EP?

Marina: Eu nunca havia gravado e foi uma experiência muito louca se ouvir com tantos detalhes. No começo achei um pouco assustador, mas depois curti bastante ver a música criando forma e sendo eternizada.

A Dan já havia gravado em estúdio com a Anti-Corpos e a Thamires, nossa baterista na época, já havia gravado com a Orgânico. Gravar foi muito importante para conseguirmos divulgar nosso som para além de São Paulo.

MG:Qual foi o tempo de produção? Marina: Nós gravamos o EP em um final de semana! Como já tocávamos essas 6 músicas há um ano e meio, em dois dias matamos as 6 músicas. Depois disso passamos por mais um dia de estúdio para revisão e ficou pronto. O GR fez tudo na nossa frente e opinamos na mixagem e na masterização.

MG:O posicionamento social de vocês em relação à muitas questões ficam explicitas nas músicas do ep. Como se deu esse processo de abordar, nas musicas, as bandeiras e opiniões que você carregam e defendem? Sapataria:Todas as músicas da banda são sobre coisas que vivemos, é tudo extremamente pessoal, mas ao mesmo tempo reflete a realidade de outras lésbicas que enfrentam lesbofobia dentro de casa, não são reconhecidas pelas sogras, são expulsas do banheiro feminino, etc. Isso nunca foi uma regra da banda, mas simplesmente aconteceu, porque a maioria dos nossos sentimentos que precisam ser gritados estão ligados a nossa condição enquanto mulheres lésbicas.

Por Nicole Micaldi.

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